sábado, 18 de dezembro de 2010

Em dia de Femi Kuti, entrevista com Tony Allen

Já que o Femi Kuti está por aí, para dois shows no Sesc Santo André, resolvi postar a entrevista com outra lenda do afrobeat, gênero com o qual o pai de Femi, Fela Kuti, provocou uma transformação - embora ainda longe de ser suficiente para a África, mais precisamente para a Nigéria -, mas ainda sim uma transformação musical, social e política.
Com a palavra, o baterista Tony Allen, que estava ao lado de Fela na criação do afrobeat. Há três anos, fui convidado para acompanhar uma semana do projeto Red Bull Music Academy - realizado naquela edição em Toronto. Na ocasião, me encontrei com o jovem de hoje 70 anos, na época com apenas 67. E segue abaixo o que Tony Allen me disse.


Como o afrobeat nasceu?

Em meu país, Nigéria, se você queria ser música você tinha de tocar todo tipo de música. De foxtrot ao jazz, ao rythm and blues. Se você é um músico profissional você tem de tocar de tudo. E foi de maneira natural. Eu, antes mesmo de tocar com Fela, estava procurando uma forma de tocar. Um estilo próprio para tocar bateria. E, quando o conheci, ele procurava um baterista e nosso trabalho tinha uma afinidade. Ele me perguntou: “Onde você aprendeu a tocar bateria? Nos Estados Unidos, na Inglaterra?” Não, eu aprendi aqui mesmo na Nigéria.


E você estudou bateria sozinho?

Sim, eu aprendi a tocar praticando e procurando um estilo próprio. Eu queria criar um estilo próprio. Eu tocava bateria em outros grupos antes do Fela e não me satisfazia. Eu queria evoluir para algo próprio.


O que é mais importante em ser músico?

Bem. Eu acho que é ser você mesmo. Acreditar em você, procurar o que você quer fazer e ser você mesmo. Eu acho que o mais importante é ser você mesmo e acreditar no que você faz. E a música, é claro.
Eu criei meu estilo procurando ser eu mesmo. Para criar um estilo próprio você tem de ser você mesmo e tocar muito. Praticar.

Então você estava misturando estilos conscientemente quando começou?

Sim, eu estava. Eu estava procurando diferentes caminhos na bateria. Eu queria evoluir. Era consciente. Não me satisfazia em fazer o que os bateristas que eu admirava faziam.


E o que mais influenciou os rumos da sua música?

É o solo que você pisa que influencia sua maneira de ser, seu estilo de vida. Não dá para nascer na Europa e ser um homem da selva. O solo que você pisa altera a sua personalidade.


O que tem de mais interessante acontecendo hoje em dia no mundo?

Todas as coisas na música são interessantes. Têm esses programas de produção, que são bem legais.


Qual a diferença para você entre tocar com o Fela e com uma banda de rock britânica, como The Good The Bad and The Queen, com o Damon Albarn (Blur) e Paul Simonon (Clash)?

Eu me sinto feliz de ser apto a tocar com eles. Em fazer algo diferente e tocar algo diferente. Eu me sinto feliz de poder fazer isso, de ter essa oportunidade.


E como é tocar com uma pessoa como o Damon Albarn?

É interessante. Para mim, ele é um gênio. O que ele faz é diferente do que se faz. Ele é um músico genial. A forma que ele compõe é diferente de outros, então ele é um gênio. Ele tem a capacidade de melhorar uma produção de um dia para o outro. Ele faz algo hoje e quando chega no outro dia muda tudo. E fica bom.


É muito diferente do que era trabalhar com o Fela, por exemplo?

Fela era um grande gênio, sem dúvida. Mas era algo mais também. Era um militante na Nigéria. Era um país muito perigoso e ele queria mudar algo. Era uma militância política importante e ele era um gênio musicalmente.


O que você conhece de música brasileira?

Eu conheço desde criança. Em meu país, quando eu era criança, sempre ouvia música brasileira na rua, até no Natal. Quando eu estive em Salvador, vi um grupo de percussão tocar no meio da rua. Eu vi no Pelourinho, todos vestidos diferentes e tocando bateria na rua. Era o Olodum. Aquilo é muito bom. Aquilo é inacreditável. É perfeito. A percussão brasileira é fantástica, é o que eu mais gosto. Eu adoro o som do tamborim.


Além do Olodum, tem algo que você goste bastante na música brasileira?

Eu gosto muito da música do Gilberto Gil. Uma vez encontrei com Gil, antes de ele virar ministro, e perguntei quando iríamos entrar em um estúdio juntos. Mas não saiu disso; agora é difícil ele ter tempo. Eu gosto muito do trabalho dele. (a entrevista é velha, eu avisei!)


Quantas vezes vocês esteve no Brasil?

Eu tive a oportunidade de estar três vezes no Brasil, sempre tocando. Eu adoro ir ao seu país. Tenho uma grande admiração pela música brasileira e pela parte percussiva em especial. Gostaria inclusive de mandar um grande abraço para todos os percussionistas brasileiros.

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